sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

ESAÚ E JACÓ: ELOGIO À ESPERTEZA E À TEIMOSIA-3



De novo Esaú e Jacó! Hoje temos mais dois capítulos dessa novela. Você vai ver que é preciso ser esperto para driblar o destino, afinal de vez em quando ele nos prega umas peças... Só com muita esperteza e docilidade para superar o que a vida nos reserva.

Capítulo 3: Driblando o destino com muita esperteza

E chega o tempo em que Isaac fica velho e quase cego. Parece que o patriarca envelhece sem enxergar o que seu filho havia feito. Ignora as atitudes impensadas de Esaú ou não quer enxergá-las, afinal ele é o queridinho do papai. Sabendo que a morte se aproxima, Isaac decide abençoar logo seu filho mais velho e morrer em paz. Antes, porém, queria comer uma bela caça preparada por ele. E chama Esaú para lhe dizer suas intenções. Esaú se faz de bobo; parece não se recordar daquele dia em que trocou o direito de primogenitura por um prato de lentilhas. O Vermelho toma o lugar do Suplantador. Esquece seu juramento e, antes que alguém se lembre do episódio passado, corre ao campo à procura de uma caça. Era preciso ficar esperto, afinal seus interesses estavam em jogo.
Mas sua corrida foi em vão. Enquanto Esaú corre no campo atrás de caça, Rebeca, que havia escutado o que Isaac dissera a seu filho mais velho, vai suplantar o verdadeiro Suplantador. E, deixando fluir toda a astúcia feminina, planeja um golpe perfeito para fazer valer os direitos de seu filho querido. Ela, que havia dado à luz Esaú como primogênito, vai dar à luz um plano engenhoso, no qual Jacó sairá com a primogenitura. “É preciso retificar os enganos da natureza”, pensa Sara. Se a vida não colabora, então, a regra é dar uma forcinha. A matriarca chama Jacó e manda-o buscar dois cabritos gordos para preparar o assado para o velho Isaac. Jacó deverá passar-se por Esaú e receber a bênção da primogenitura dada por seu pai.
Jacó teve medo. Vacilou. Ficou vermelho de medo e de vergonha só em pensar na trapaça. Só pode ser ironia, pois seu nome – Suplantador – parece não lhe cair bem nessa hora. Ele sabe que o plano é perigoso e arriscado. Sabe dos riscos que corre. Se seu pai descobre, ele estará perdido: em vez de bênçãos atrairá maldições sobre si. Jacó se revela responsável e sério demais para quem carrega esse nome; ele tem brios na cara e cora-se de temor. Mas a mãe está determinada. Arrisca, inclusive, a atrair as maldições para si no lugar do filho. Nenhuma maldição, porém, deve ser pior que ver seu povo sujeito às irresponsabilidades de Esaú. Está valendo tudo nessa hora para dar um empurrãozinho na sorte.
E Jacó obedeceu a sua mãe. Correu ao pasto, pegou os cabritos. Rebeca preparou uma bela refeição para seu marido. Depois, tomou as melhores vestes de Esaú e vestiu-as em Jacó. Com as peles dos cabritos, cobriu-lhe as mãos e a parte lisa do pescoço. Pôs nas mãos do filho mais novo o assado e o pão que havia preparado. E Jacó os levou ao seu pai. E, como num filme de suspense, só restava torcer e esperar para ver o resultado. Jacó agora teria que honrar seu nome. Teria que provar que é esperto e inteligente o suficiente para assumir a liderança de sua gente. Teria que provar que os valores de seu povo são importantes para ele a ponto de arriscar a própria pele nessa causa. Teria que fazer o jogo da trapaça de forma perfeita. Ingenuidade e escrúpulos não resolvem nada nessa hora. Garra e determinação contam mais que falsos escrúpulos. E lá vai ele entrando no quarto de seu pai, disposto a suplantar seu irmão.
Chegando com o jantar ao aposento de seu pai, Jacó disse: “Meu pai!”. E o pai logo respondeu: “Quem és, meu filho?”. “Sou eu, Esaú, teu filho primogênito. Fiz como me mandaste. Levanta-te, come de minha caça, para me abençoares”. O pai estava velho, mas não era burro. Estranhou: “Meu filho, como conseguiste achar uma caça tão depressa?”. E ele respondeu: “O Senhor Deus me deu sorte!”. E Isaac chama Jacó até ele, apalpa-o, verifica se suas mãos são mesmo peludas e diz: “A voz é de Jacó, mas as mãos são de Esaú”. E, depois de comer, decide abençoar seu filho. Chama-o de novo junto a si para beijá-lo e, sentindo o cheiro de suas roupas, abençoou-o: “Este é o cheiro do meu filho: é como o aroma de um campo que o Senhor abençoou! Que o Senhor te conceda o orvalho do céu e a fertilidade da terra, trigo e vinho em abundância. Que os povos te sirvam e as nações se prostrem diante de ti; sê o senhor de teus irmãos, e diante de ti inclinem-se os filhos de tua mãe”. Ufa! Que alívio! O plano havia dado certo: Jacó podia respirar em paz. Havia conseguido a preço de muita esperteza a bênção da primogenitura.

Capítulo 4: Deus abençoa o espertalhão?

Daí para frente é só confusão, mas nada que possa desfazer a força da bênção pronunciada. Esaú chega e descobre a trapaça. Nem assim cai na real. Nem assim reconhece que havia vendido seus direitos. E culpa seu irmão de trapacear com ele duas vezes: “Primeiro me tirou a primogenitura, e agora usurpou minha bênção. Ele é mesmo um suplantador, conforme diz seu nome”, grita Esaú. Até parece que não foi Esaú quem vendeu a bênção, e que a bênção do primogênito não está atrelada ao direito de primogenitura. De novo o verdadeiro suplantador se esquiva da culpa e procura um jeito de se fazer de vítima para virar o jogo.
Cheio de cólera, Esaú vai perseguir seu irmão. Mas, muito esperta, Rebeca despacha seu filho para terras bem distantes e manda que procure uma esposa entre sua parentela. Jacó parte para as terras de Labão, seu tio. Depois de uma boa caminhada, Jacó resolve descansar da labuta. Parou quando o sol se pôs e ajeitou uma pedra como travesseiro para dormir. E teve um sonho nada corriqueiro: “Viu uma escada apoiada no chão e com a outra ponta tocava o céu. Por ela subiam e desciam os anjos de Deus. No alto da escada estava o Senhor que lhe dizia: Eu sou o Senhor, Deus de teu pai Abraão, o Deus de Isaac. A ti e à tua descendência darei a terra em que estás dormindo. Tua descendência será como a poeira da terra. Tu te expandirás para o ocidente e para o oriente, para o norte e para o sul. Em ti e em tua descendência serão abençoadas todas as famílias. Eu estou contigo e te guardarei aonde quer que vás, e te reconduzirei a esta terra. Nunca te abandonarei até cumprir o que te prometi” (Gn 28, 13-15).
Para o leitor da Escritura, já acostumado com a ação divina por meio de sonhos, essa manifestação não surpreende tanto. Deus tem mesmo a mania de fazer e acontecer quando os personagens dormem. Enquanto Adão dorme, Deus cria sua companheira. José do Egito dorme e tem um elenco sem fim de sonhos inusitados. O faraó sonha para José ter que interpretar. O profeta Joel afirma que no final dos tempos os jovens terão sonhos e os velhos, visões. No NT, o anjo aparece a José em sonhos, os magos são avisados por Deus em sonho que não devem dar satisfações para o rei Herodes de onde está o menino Jesus, etc. É assim mesmo: enquanto o ser humano dorme, Deus age. Fica bem mais fácil assim; não tem ninguém para o atrapalhar na sua ação salvífica. O autor, já habituado a esse recurso literário, entende que é preciso colocar Jacó para dormir. Deus quer agir.
Se a ação de Deus por meio do sonho não surpreende o leitor da Escritura, no entanto, uma surpresa está reservada para o relato do sonho em Betel: Deus, o Senhor, confirma a Jacó a bênção recebida de seu pai Isaac. Deus aprova a trapaça de Jacó e de Rebeca e confirma sua presença junto do espertalhão, dando-lhe inclusive garantias de sua presença ao longo do caminho. Pode ser que por essa o leitor não esperasse. E o mais surpreendente: a bênção de Deus dada a Jacó tem muita semelhança com as promessas feitas a Abraão, o pai da fé: possuir a terra em herança, ser um grande povo como a poeira da terra, ter as famílias abençoadas por seu intermédio, ter a garantia da companhia e proteção do Senhor, ser reconduzido à terra (cf. Gn 12,2-3; 13,14-1; 15,5-7).

Na semana que vem tem mais. Fique atento!


Solange Maria do Carmo

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